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A MPB e a História do Brasil no século XX

14/02/2013 17:50

A MPB e a História do Brasil no século XX

“Nós somos as cantoras do rádio, levamos a vida a cantar.

De noite embalamos teu sono, de manhã nós vamos te acordar
Nós somos as cantoras do rádio, nossas canções cruzando o espaço azul,
Vão reunindo num grande abraço, corações de Norte a Sul.(…)”

Cantores do Rádio“, de Lamartine Babo.

Primeira parte:
Ajudando a definir a identidade cultural do brasileiro.

Não tem melhor forma de começar a série de três textos sobre a música popular brasileira no século XX sem falar na formação da identidade cultural do povo brasileiro. A MPB ajudou a cunhar grande parte desta identidade, e podemos afirmar isso sem medo de exagerar. Além de instrumento cultural, a MPB foi, por diversas vezes, instrumento político e ideológico.

Em alguns momentos ajudou na propaganda política. Em outros, lutou contra o silêncio imposto pelos governantes. Refletiu mazelas que a população sofria. Expôs feridas. Caracterizou elementos da população e popularizou costumes e gírias.

Pixinguinha e Vinicius

Pixinguinha e Vinicius

Na foto ao lado, dois dos maiores expoentes da música popular brasileira: Pixinguinha e Vinicius. O primeiro, um verdadeiro maestro, um gênio da música instrumental, considerado por muitos o verdadeiro “pai” da música popular brasileira. O segundo foi um grande poeta, carinhosamente chamado de poetinha, compondo canções belíssimas e poemas que até hoje embalam vários casais apaixonados.

Não dá para imaginar a música brasileira sem estes dois ícones, assim como não dá para falar de música no Brasil sem citar um outro elemento importantíssimo para a popularização de vários artistas. Este elemento não era um músico. Não compunha, não tocava instrumentos e sequer tinha mãos para tal, pois não era uma pessoa e sim um objeto, cada vez mais presente nas casas brasileiras a partir da década de 1930: o rádio.

A Era do Rádio:

A primeira transmissão radiofônica do Brasil aconteceu em 1922, com um pronunciamento do então presidente Epitácio Pessoa, e a transmissão da ópera “O Guarani” diretamente do Theatro Municipal no Rio de Janeiro.

Mas as primeiras radiodifusoras do Brasil inauguraram suas transmissões somente em 1923. Na programação, além dos noticiários, as emissoras começaram a investir na música e nos programas que eram transmitidos “ao vivo” diretamente dos auditórios, com a participação dos melhores artistas da época.

Gradativamente o rádio foi tomando lugar como importante veículo de comunicação e entretenimento da população brasileira. Comerciantes colocavam rádios em seus estabelecimentos “para atrair a freguesia”. Era mais rápido transmitir fatos pelas ondas do rádio do que pelos jornais. Não é exagero dizer que com o rádio a comunicação sofreu uma nova revolução, após a invenção do telégrafo no século XIX.

vargas_radioMas é a partir de 1930, com o governo de Getúlio Vargas – na foto ao lado aguardando, pelo rádio, o resultado das eleições – que o aparelho, no Brasil, tem seu grande salto enquanto instrumento de comunicação de massa. O governo na época incentivou o desenvolvimento profissional, técnico e comercial dos profissionais que trabalhavam diretamente nas rádios brasileiras. Mas, ao mesmo tempo que incentivava o desenvolvimento da “indústria do rádio”, o governo censurava aqueles meios de comunicação que eram opositores do regime, principalmente após o golpe de 1937.

O governo Vargas também ficou marcado por uma forte propaganda nacionalista, focando justamente na identidade do povo brasileiro. Portanto, nada mais justo do que valorizar a cultura do país, a maior expressão desta identidade nacional brasileira, propagada pelas ondas do rádio.

E como o governo incentivava o entretenimento – até mesmo para desviar o foco das críticas – as rádios passaram a contratar artistas para seus programas de auditório, ao invés de só convidá-los para um ou dois programas, ainda mais após a liberação dos reclames, os comerciais entre a programação, já que as rádios dependiam dos anunciantes para manter tudo funcionando.

Artistas como Carmen Miranda, Heleninha Costa, Ataulfo Alves, Dolores Duran, Nelson Gonçalves, Orlando Silva, Sílvio Caldas, Araci de Almeida e Dalva de Oliveira entraram para a História da Música Brasileira interpretando composições de Lamartine Babo, Ary Barroso, Braguinha, Joubert de Carvalho, Noel Rosa e Cartola, entre outros. Qualquer pesquisa rápida no Google vai levá-los à composições da época, acho que não é necessário linkar nenhuma música.

Cesar de Alencar e Dircinha cantam na Rádio Nacional. [fonte]

Durante as décadas de 1930, 40 e 50, músicas como “Aquarela do Brasil“, “Ave Maria do morro“, “Estatutos da Gafieira“, “Mulata assanhada” e “Carinhoso” cantavam a alegria, as belezas naturais do Brasil, as mazelas, a malandragem do povo brasileiro.

Junto a isto, no final da década de 1950 inicia-se no Brasil um grande movimento musical: a bossa nova, nascida entre os músicos da classe média-alta do Rio de Janeiro. Na verdade, a bossa era uma forma diferente de cantar o samba, abusando do violão e do piano em um ritmo mais cadenciado, mas com o tempo a bossa incorporou alguns elementos do jazz norte-americano e acabou virando um ritmo único no mundo, feito por brasileiros e consumido pelo planeta.

Além do nascimento da bossa nova nos fins de 1950, temos que citar que durante as décadas de 1940 e 1950 o país passou por algumas mudanças importantes. Getúlio, que deixou o poder após o fim da Segunda Guerra, voltou eleito pela população – ele ficou no poder até 1945 após um já citado golpe em 1937. O mundo não estava mais em guerra, o país estava diretamente alinhado com os EUA em sua política externa, mas entre a população e os políticos encontrávamos membros simpatizantes da ideologia comunista, que já polarizava o mundo desde o fim da Segunda Guerra.

JK na radio nacionalApós o suicídio de Getúlio Vargas em 1954, Juscelino Kubitschek – na foto ao lado em uma visita à Radio Nacional – é eleito para o cargo máximo da nação, e o presidente bossa nova, como era conhecido, mudou a capital do Rio de Janeiro para Brasília, cidade no planalto central projetada e construída para servir de centro governante do país.

Durante a década de 1950 o Brasil talvez tenha assistido – ou melhor, ouvido! – o ápice do rádio, presente na imensa maioria de lares brasileiros. Assim como hoje em dia a TV influencia opiniões e costumes, na época o rádio ajudava a construir parte desta cultura brasileira.